Elizabeth Taylor, repetindo performance de há seis anos, ganhou o Oscar de melhor atriz de 1966 por seu desempenho em Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, a produção da Warner que foi batida por um prêmio (seis a cinco) nas cerimônias deste ano, transmitida de costa a costa dos EUA, por um filme britânico, O Homem Que Não Vendeu Sua Alma. Este narra a luta de Sir Thomas More contra os acólitos de Henrique VIII e foi aclamado o melhor filme. Também por sua interpretação, ganhou Paul Scofield o Oscar de ator principal; e o diretor Fred Zinnemann, premiado anteriormente, em 1953, por A Um Passo da Eternidade, foi o ganhador do Oscar 66. O filme britânico arrebatou ainda prêmios de fotografia em cores, vestuário e roteiro de Pierre Uytterhoeven. Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, que é uma peça quase genial de Edward Albee sobre um casal desajustado, ganhou, além do prêmio de Elizabeth Taylor, pela fotografia em preto-e-branco, indumentária e cenografia, além de conceder o laurel de atriz coadjuvante a Sandy Dennis. Já o prêmio de ator coadjuvante foi para Walter Matthau, pelo filme Uma Loura Por Um Milhão. E o diretor Claude Lelouch ganhou o prêmio pelo melhor filme estrangeiro, Um Homem, Uma Mulher.
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Há trinta e nove anos existe o Oscar. Vários filmes já exploraram o que acontece por trás da conquista do mais cobiçado prêmio cinematográfico do mundo – mais que a Palma de Ouro, de Cannes, o Leão de São Marcos, de Veneza, o Urso de Ouro, de Berlim etc. Nenhum deles, e nem qualquer conto ou novela relatou, com exatidão, a batalha dos talentos que ocorre, cada temporada, em busca do triunfo máximo, em Hollywood, a posse da estatueta chamada Oscar.
Tudo começa à meia-noite do dia 31 de dezembro – e dura até abril, época da distribuição dos lauréis correspondentes ao ano anterior. O nome não importa, nem as causas: os efeitos são explosivos. Tudo porque, para sua maior glória, e a da indústria cinematográfica, razão mesma da instituição, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Los Angeles prepara o cenário do maior espetáculo de Relações Públicas da Terra. Na maioria das eleições, desde a ágora ateniense, os cidadãos comparecem às urnas e depositam votos para seus candidatos. Na Academia é diferente. Onde houver um dos seus membros, em Londres, Bombaim, até na mansão do governador da Califórnia (Ronald Reagan), há teoricamente um posto de votação. E cédulas. E envelopes. A Academia tem quase 3.000 sócios. E entre seus ex-presidentes figuram Douglas Fairbanks pai, Frank Capra, Bette Davis (única mulher a ser eleita) e George Stevens. O atual mandachuva é o compositor musical e produtor Arthur Freed. Há quinze classes de associados, sendo as principais as dos atores, fotógrafos, músicos, produtores, sonoplastas, roteiristas e administradores.
Como se ganha um Oscar? Bem, antes de tudo será preciso ganhar a indicação (nomination). Aí é que entram as ambições desmedidas, as deslealdades profissionais, as fofocas. Por exemplo, tudo aquilo comum na Hollywood tão bem retratada em The Day of the Locust, de Nathanael West, ou em The Last Tycoon, de F. Scott Fitzgerald, ou em Should Have Stayed Home, de Horace McCoy. Valem todas as traições, o oportunismo é a palavra de ordem entre janeiro e abril. A mecânica do páreo? Simples. Por exemplo, no fim de 1966 a Academia imprimiu uma lista de todos os filmes exibidos durante o ano na área de Los Angeles, tanto os produzidos nos EUA como em outros países. Elegíveis são todos. Cada sócio vota em até cinco filmes: são as indicações. Há um segundo voto separado. Aqui, o voto seletivo, o voto de classe ou preferencial. Atores indicam melhores atores e atrizes; sonografistas votam no melhor som; cenografistas no melhor décor, e assim por diante. Apurados por uma firma de auditores, tais votos são anunciados como indicativos das preferências, no dia 20 de fevereiro, em uma entrevista coletiva regada a uísque. Nas indicações de 1966, o filme Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, por exemplo, venceu em treze 13 categorias, estabelecendo um recorde. Foram indicados favoritos o diretor, Mike Nichols, o autor do roteiro, Ernest Lehman, os quatros atores centrais, Burton, Taylor, Segal e Dennis, o coordenador (ou montador) Sam O’Steen, os cenógrafos Rick Silbert e George James Hopkins, o fotógrafo Haskell Wexler, a figurinista Irene Sharaff, a música de Alex North e o som de George Groves. A Warner, distribuidora e produtora, ficou em estado de euforia. Já a United Artists também está contentíssima, lidera todas as empresas, pois somando todos os filmes, conquistou 19 indicações. É preciso considerar que as indicações constituem valioso aumento salarial e novos contratos de produção e exibição – mas nem sempre os favoritos ganham a parada. Na noite de 10 de abril, quando os envelopes finais são abertos, aí, sim, muita gente sofre dores de cabeça homéricas. Pois há só um vencedor para cada categoria. Essa segunda votação é produto do seguinte: após as indicações, a Academia exibe para seus sócios e convidados especiais todas as fitas apontadas. Duas exibições são feitas, e novamente novos envelopes são enviados, com cédulas, aos espectadores que, livremente, apontam os melhores. No palco, o mestre de cerimônias abre os envelopes, e muita gente começa a chorar, outros a rir, todos aplaudem – ainda que se roendo de inveja.
O primeiro filme a receber o atleta dourado foi a produção de 1928 Wings / Asas, da Paramount, dirigida por William Wellman. Mas o prêmio de direção foi dividido (nos primeiros anos admitia-se a divisão, hoje superada) entre Frank Borzage (Seventh Heaven / Sétimo Céu) e Lewis Milestone por Two Arabian Knights / Dois Cavaleiros Árabes. A estrela número um detentora do Oscar foi a suave Janet Gaynor, que naquele ano apareceu em Sétimo Céu, em Street Angel / Anjo das Ruas e em Sunrise / Aurora. Finalmente, o primeiro ator premiado foi o alemão Emil Jannings, pela inesquecível atuação em The Way of All Flesh / Tortura da Carne. Não vamos, aqui, relacionar todos os filmes, atores e diretores a quem o Oscar veio enaltecer dentro da Indústria e da arte. Mas vale recordar alguns casos célebres. Assim, não é difícil encontrar diretores repetentes. Praticamente, quase todos os grandes obtiveram dois Oscar: Milestone (28, 30), Frank Borzage (28, 32), Frank Lloyd (29, 33), Leo McCarey (37, 44), Joseph L. Mankiewicz (49, 50), Elia Kazan (47, 54), George Stevens (51, 56), Billy Wilder (45, 60). Raros, porém, os supercampeões. O maior deles, John Ford, com quatro Oscars: 1935, 1940, 1941 e 1952. Tricampeão foi Frank Capra: 34, 36, 38. Também William Wyler: 42, 48, 59. Pouquíssimos, entretanto, os atores que bisaram o prêmio: entre os homens somente Fredric March (1932, 1946), Spencer Tracy (37, 38), Gary Cooper (41, 52), entre as mulheres Bette Davis (35, 38), Luise Rainer (36, 37), Olivia de Havilland (46, 49) e Vivien Leigh (39, 51).
Ao longo de sua existência, o Oscar tem sido negado a alguns ídolos imortais como Greta Garbo, Marilyn Monroe e a um gênio como Orson Welles. O estranho critério da maioria inesclarecida tem presidido à seleção; por isso, as injustiças clamorosas, como relegar ao olvido Citizen Kane / Cidadão Kane e premiar abacaxis homéricos como Ben-Hur. Não tem havido, felizmente, restrição a qualquer gênero. Assim, musicais como Broadway Melody (1929) e An American in Paris / Sinfonia de Paris (1951) figuram na galeria ao lado de um clássico bélico chamado All Quiet on the Western Front / Sem Novidade no Front (1930), de uma comédia sofisticada como It Happened One Night / Aconteceu Naquela Noite (1934), uma tragédia clássica do tipo de Hamlet (1948), ou um drama social moderno como Marty (1955). E, Relações Públicas à parte, que extraordinária promoção cultural tem constituído o Oscar, a despeito de toda a deterioração que sofre e que impõe aos militantes do cinema!
“O Oscar de cada um”; Correio da Manhã (12 de abril de 1967)
Foto do cabeçalho: Fred Zinnemann com as estatuetas de O Homem que Não Vendeu sua Alma

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Na trilha do tio Oscar, por Paulo Emílio Sales Gomes