Por que Laranja Mecânica?

Tanto o romance quanto o filme chamam-se Laranja Mecânica. Publiquei o livro pela primeira vez em 1962, e desde aquele ano conquistou leitores nos dois lados do Atlântico, o suficiente para garantir sua contínua impressão. No entanto, dez anos depois de corrigir as provas de gráfica, seu título e conteúdo tornaram-se conhecidos por milhões, não apenas milhares, graças à adaptação cinematográfica bastante fiel feita por Stanley Kubrick. Vi-me convocado, então, a explicar o verdadeiro significado, tanto do livro quanto do filme, em todas as mídias públicas dos Estados Unidos, e também em algumas da Europa, e minha explicação tem sido, mais ou menos, a seguinte.

Primeiramente, o título. Ouvi a expressão “tão estranho quanto uma laranja mecânica” pela primeira vez em um pub londrino, antes da Segunda Guerra Mundial. Trata-se de uma gíria cockney antiga que se refere a uma esquisitice ou insanidade tão extrema que chega a subverter a natureza – afinal, que noção poderia ser mais bizarra do que uma laranja mecânica? A imagem atraiu-me não somente como algo fantástico, mas também como algo obscuramente significativo; surreal, mas também obscenamente real. O casamento forçado de um organismo com um mecanismo; de uma coisa com vida, que amadurece, é doce, suculenta, com um artefato frio e morto – seria apenas um conceito assustador? Descobri a relevância desta alegoria para o século 20 quando, em 1961, comecei a escrever um romance sobre curar a delinquência juvenil. Li em algum lugar que seria uma boa ideia liquidar o impulso criminoso por meio de terapia de aversão; fiquei estarrecido. Comecei a investigar as implicações dessa noção em um breve trabalho de ficção. O título Laranja Mecânica parecia estar ali, esperando para se vincular ao livro: era o único nome possível.

Anthony Burgess, escritor, autor do livro Laranja Mecânica, que deu origem ao filme de Stanley Kubrick. O trecho acima está no ensaio “A Condição Mecânica”, escrito em 1973 e republicado na edição especial de 50 anos de Laranja Mecânica, em 2012, pela Editora Aleph (pgs. 298-299).

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