Alguns filmes para refletir sobre o trabalho e o lugar do homem no mundo. Por isso, filmes humanistas, sobre seres que, em algum momento de suas existências, perdem o controle, enlouquecem, e continuar a servir cegamente o mesmo sistema que os destrói. Uma lista repleta de pérolas.
A Última Gargalhada, de F.W. Murnau
Quando o status destrói o homem. O peso da roupa, da farda, na sociedade alemã dos anos 1930, pouco antes da ascensão nazista. Porteiro de um hotel, o protagonista é rebaixado a cuidador do banheiro. Ao trocar a roupa e o posto, ele vê-se esmagado pela sociedade e pelo status que perdeu.

Tempos Modernos, de Charles Chaplin
Quando a máquina engole o operário. A ovelha negra destaca-se entre as brancas. Na linha de produção, o homem é engolido pelas peças rodantes. Chaplin fez o filme definitivo sobre a não adequação do homem ao mundo maquinizado, com suas rotinas extenuantes e repetição interminável.

Ladrões de Bicicleta, de Vittorio De Sica
Quando trabalho e crime aproximam-se. O casal vende seu enxoval para comprar uma bicicleta. O meio de transporte servirá ao trabalho do marido. Quando a bicicleta é roubada, o protagonista sai em um jornada existencial e chega a se converter em criminoso para tentar voltar ao trabalho.

O Capote, de Alberto Lattuada
Quando o trabalhador transforma-se em fantasma. O protagonista é um pouco chapliniano. Sua tragédia ecoa a de A Última Gargalhada. Ele tem um casaco furado e precisa comprar outro, novo. Ele morre, converte-se em fantasma e somente quando morto passa a ser visto por alguns.

O Salário do Medo, de Henri-Georges Clouzot
Quando qualquer movimento pode levar à morte. Em um país da América Latina, quatro homens aceitam o pior trabalho do mundo: transportar alguns litros de nitroglicerina através de estradas esburacadas. Cada freada ou curva pode significar uma explosão e suas próprias mortes.

A Classe Operária vai ao Paraíso, de Elio Petri
Quando a consciência confronta a linha de produção. A tragédia do operário exemplar Lulu Massa, que perde um dedo, ganha um pouco de consciência e se descobre escravizado pelas máquinas sobre as quais antes se debruçava com prazer. Um filme destruidor. Grande momento de Petri.

O Homem de Mármore, de Andrzej Wajda
Quando o mito do partido engole o operário. Uma jovem cineasta investiga a vida de um homem que foi usado como propaganda pelos comunistas. Trata-se de um pedreiro considerado operário exemplar. No início, ela encontra sua estátua, o “homem de mármore”, e decide saber quem ele é.

O Sucesso a Qualquer Preço, de James Foley
Quando o trabalho converte-se em vender ilusões. Os homens em questão, vendedores, são incitados a comercializar terrenos em uma noite de chuva. Há uma disputa entre eles. Não vemos e não sabemos o que realmente estão vendendo. Essa loucura resume bem nossos tempos modernos.

Rosetta, de Jean-Pierre e Luc Dardenne
Quando o trabalho converte-se no motivo de existir. A protagonista, Rosetta, acredita que só trabalhando pode ser alguém. Esse grande filme mostra sua jornada entre o trailer no qual mora com a mãe e as tentativas de conquistar um emprego, o que pode levá-la até a matar um amigo.

O Corte, de Costa-Gavras
Quando a busca por emprego converte-se em terror. Para conquistar um desejado posto de trabalho, o protagonista resolve tomar o caminho impensável: matar todos os seus concorrentes diretos. Tem início uma fita de serial-killer. A comédia de Gravas mescla crueldade e realismo.

Obediência, de Craig Zobel
Quando o trabalhador torna-se suspeito. A história da funcionária de uma lanchonete acusada de um crime que não cometeu. Ela é submetida a um interrogatório humilhante após sua gerente receber uma ligação de alguém que se passa pela polícia e informa um suposto furto no balcão do comércio.

O Valor de um Homem, de Stéphane Brizé
Quando o trabalhador torna-se perseguidor. Em busca de um trabalho, o protagonista termina como segurança de supermercado, no qual descobre a total ausência de humanismo empregada na rotina diária. Obra sufocante do talentoso Brizé, responsável pelo recente Em Guerra.

Você Não Estava Aqui, de Ken Loach
Quando o trabalhador é escravo do aplicativo. O mundo das entregas por aplicativo, no qual tempo é dinheiro e a velocidade não respeita barreiras humanas, chega-nos pela ótica do sempre crítico Ken Loach. Em cena, a ideia de ter o próprio negócio é demolida. O homem é peça.

SOBRE O AUTOR:
Rafael Amaral é crítico de cinema e jornalista (conheça seu trabalho)
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Você Não Estava Aqui, de Ken Loach