Eu sentia uma espécie de irritação pelo fato de as pessoas terem gostado muito de Uma Mulher para Dois, e me dizia que a culpa era minha, que não tinha feito o filme bastante pessimista, nem ao menos bastante duro. Então decidi fazer Um Só Pecado, para mostrar que o amor é algo de muito menos alegre e eufórico. Portanto, realizei-o como uma resposta para Uma Mulher para Dois: são as mentiras, o lado sórdido, a vida dupla, é um filme incômodo. Os filmes são respostas uns aos outros. Um Só Pecado me fez sofrer, pois foi vaiado em Cannes, além de ter tido uma carreira difícil. Senti insatisfação, e Domicílio Conjugal foi uma resposta a Um Só Pecado. Pensei: “Vou refazer o mesmo filme e mostrar que se pode dizer isso rindo, ao invés de se ficar encrespado”. É o que explica a existência de cenas bastante parecidas, de semelhanças enormes entre os dois filmes. O segundo é uma versão alegre do primeiro, mas, depois de terminar Domicílio Conjugal, achei que ele também era um filme triste… Quando falamos de adultério, não conseguimos ser engraçados, a não ser que mintamos, como em certas comédias americanas. Tratado com um certo realismo, o adultério é forçosamente um tema triste.
François Truffaut, cineasta, em O Cinema Segundo François Truffaut – Textos Reunidos por Anne Gillain (Editora Nova Fronteira; pg. 272). Acima, cena de Domicílio Conjugal; abaixo, Truffaut e Jeanne Moreau nos bastidores de Jules e Jim – Uma Mulher para Dois.

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