Meus Antonionis preferidos se dividem em dois blocos. O primeiro inclui A Aventura (1960), A Noite (1961) e O Eclipse (1962) e foi chamado, na época, de Trilogia da Incomunicabilidade. Nunca entendi por quê. Continuo não entendendo. Os personagens de Antonioni só podem parecer pouco comunicativos aos olhos de uma cultura que confunda a verborragia com a comunicação, o falar com o dizer.
Tome A Noite: poucos filmes ou livros nos dizem de maneira tão simples e correta o que é um casal e o que é um amor. E poucos amantes, cinematográficos ou literários, conseguem, como Giovanni (Marcello Mastroianni) e Lidia (Jeanne Moreau), em A Noite, dizer tudo o que é preciso e NADA MAIS.
Com Antonioni, aprendi que há uma ética da troca amorosa. Por exemplo, num momento do filme, Lidia some pelas ruas de Milão, durante uma tarde inteira. Quando, enfim, ela se manifesta com um telefonema, a discrição de Giovanni não é um drama da “incomunicabilidade”, é a reserva de quem, no amor, preserva o respeito pela complexidade do outro.
O cinema é uma boa parte de nosso repertório amoroso. Pois bem, no amor, como num set de filmagem, é necessário, de vez em quando, avisar: “Silêncio! Ação!”. Qualquer casal, em crise ou não, que seja tentado pela ideia de sentar e “discutir a relação” poderia (com bastante proveito) sentar e assistir à Noite.
Meus outros Antonionis preferidos são Blow-Up, de 1966, (misteriosamente traduzido como Depois Daquele Beijo) e Profissão: Repórter, de 1975. Esses dois filmes foram a melhor resposta que minha geração recebeu a seus anseios vagos e frustrados por uma “outra” vida, diferente da mesmice acomodada que receávamos para o futuro.
Contardo Calligaris, psicanalista e escritor, em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, na ocasião da morte de Michelangelo Antonioni, ocorrida em 30 de julho de 2007 (“Antonioni”, Caderno Ilustrada, 9 de agosto de 2007; leia aqui). Acima, cena de Blow-Up; abaixo, o casal central de A Noite.
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