O Melhor da Juventude, de Marco Tullio Giordana

Dois irmãos viajam na companhia de uma garota. Fazem um percurso de descobrimento enquanto tentam ajudá-la a reencontrar o pai. Dessa viagem a três, ela é detida pela polícia e tem de retornar ao hospital psiquiátrico em que estava internada. O retorno de Giorgia (Jasmine Trinca) é um importante ponto de virada em O Melhor da Juventude.

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A partir dele, a juventude não será mais a mesma. As personagens começam a envelhecer. Não demora para que um dos irmãos, Matteo (Alessio Boni), desista da viagem e volte à cidade grande, Roma. Responsável por resgatar a moça do hospital, ele não vê mais sentido na jornada. O outro irmão, Nicola (Luigi Lo Cascio), continua.

Os rapazes tomam rumos opostos, o filme acompanha ambos. Nicola não se deixa vencer pela perda da garota, que volta para o hospital onde é tratada com eletrochoques; Matteo não suporta esta e outras derrotas, toma o trem e se inscreve na carreira militar.

O primeiro é a consciência do filme, aquele que deixa prever o drama, que dá segurança ao espectador; o segundo, vida imprevisível, cercada pelos receios de alguém que acredita em seguir ordens, que viu a liberdade dos outros ruir pelo fracasso de alguns. Pelo seu fracasso, pela dificuldade de ser alguém que os outros desejam, ou de proteger inocentes.

Lidar com as frustrações, ou destas arrancar algo para se reerguer. Ainda que tudo pareça clichê, e ainda que as seis horas do filme de Marco Tullio Giordana quase sempre flertem com o drama fácil, há algo de valioso nos quase 40 anos da vida desses rapazes, irmãos, depois homens; também de seus irmãos, mulheres, filhos, pais.

E ainda que se escape com frequência às personagens secundárias, são os dois que estruturam a narrativa, nos quais as diferenças são quebradas pelos abraços de reencontro, nos quais, sobretudo, as diferenças nunca se tornam problemas aos olhos do espectador – seja para um ou para outro, o marrento ou o flexível.

O soldado torna-se policial; o viajante, um psiquiatra. Matteo convive com o choque, não se entende, não deixa o público prever seus passos. Nicola, o previsível, une-se a uma mulher de ideias revolucionárias, por quem se apaixonou ao vê-la tocar piano entre a lama, na Florença inundada de 1966. Com Giulia (Sonia Bergamasco), tem uma filha.

Matteo não consegue manter vínculos afetivos. Ao conhecer uma bela mulher, Mirella (Maya Sansa), usa o nome do irmão, como se quisesse ser o outro, talvez para viver sua realização, a continuidade de uma viagem que, no passado, teve de interromper. Almeja, na máscara que assume, uma vida de escolhas, sem se sujeitar à ordem direta dos outros e do Estado.

O Melhor da Juventude é, para Matteo, sobre uma vida indefinida, sem sonhos realizados ou conquistas a tocar. O frustrado esperneia, briga com constância. O filme todo parte de uma juventude quebrada, simbolizada pela prisão da menina mais deslocada e incompreendida do que louca. De uma geração que vive para salvar a arte, em Florença (na primeira parte), para sonhar com a revolução (na segunda) e vê-la ruir (na terceira).

A quarta e última parte pretende unir laços, pessoas, inclusive ao espírito de Matteo em cena. Para resolver o que o próprio não conseguia: para guiar os novos velhos amantes ao caminho que não se contorna, dessa estrada que Tullio Giordana traça como destino. Ainda assim, e justamente com Matteo, não se pode ter certeza de tudo.

O melhor de uma juventude que, nos anos 1960, apresenta-se cheia de sonhos e desejos de mudança. Para uma viagem que ninguém terminou, nem mesmo Nicola. Uma jornada que dura seis horas, algumas décadas, à qual a longa extensão é necessária para compreender não o que essas pessoas se tornaram, mas para ver a dificuldade de se driblar os obstáculos pelo caminho. O tempo dá a densidade de Matteo e Nicola.

(La meglio gioventù, Marco Tullio Giordana, 2003)

Nota: ★★★★☆

Veja também:
Ema, de Pablo Larraín

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