Os motivos por trás da refilmagem de Psicose, segundo Gus Van Sant

Bem, a experiência de fazer Psicose não foi tanto pelo fato de ter sido um fã de Hitchcock, mas apenas porque era um filme bastante conhecido da Universal. Já sabia que a Universal detinha os direitos. Era o tipo de filme que provavelmente não seria considerado para um remake por ser tão famoso. Na época eu me perguntava por que os estúdios costumavam fazer remakes de filmes desconhecidos. Então pensei que seria interessante fazer o remake de um filme bastante conhecido. Eles sugeriram que teriam muitos filmes na prateleira que poderiam me interessar para um remake. Então aventei Psicose, porque sabia que era um filme da Universal e sabia que haveria, talvez, algum tipo de reação negativa para esta ideia. Continuei falando disso pra eles, até que por fim eles me permitiram fazer o filme após Gênio Indomável, porque Gênio Indomável fez muito dinheiro (risos). Não teve nada a ver com meu conhecimento sobre Hitchcock, que era bastante limitado.

 

(…)

 

A hostilidade em torno do filme aconteceu por uma razão interessante, e acho que foi pelo pressuposto de que, pelo fato de eu estar refilmando o filme cena por cena, eu estaria de alguma forma desafiando Hitchcock. Não sei exatamente o porquê dessa reação. Se eu quisesse realmente desafiá-lo, eu teria mudado o filme. De alguma forma eu era contra o hábito de se fazer um remake que simplesmente pegava emprestado o roteiro, e também contra a ideia de se mudar o final como faziam os remakes, característica da época nos anos 1990. (…) Por que fazer um remake que apenas pega emprestado o roteiro? Por que não se pegar emprestado também do trabalho do próprio diretor? Sendo assim, por eu querer refazer cena por cena, ficou em alguns momentos como se fosse um desafio, eu desafiando o Hitchcock, quando na verdade eu estava tentando homenagear o Hitchcock.

 

(…)

 

(…) uma das ideias era a de tornar um filme antigo mais popular; então um dos muitos conceitos era fazê-lo com um elenco moderno e em cores. Esse era um dos pressupostos “geradores de renda”. Quero dizer, a parte do experimento foi ver se conseguíriamos, ou não, meio que renovar, como uma regeneração tipo Frankenstein de um filme que já tivesse sido feito, que tivesse sido bem-sucedido. Parte da experimentação foi a faceta totalmente comercial. Então, uma das regras deste conceito era que se fizesse alguma coisa com referências modernas, tais como um certo elenco e o que mais fosse popular, como o uso da cor em vez de preto e branco. Preto e branco não era mais entendido pelo público. As pessoas simplesmente pensavam que preto e branco não era arrojado. E havia algo no preto e branco que por algum motivo o público não iria aceitar, da mesma forma que não aceitam som em mono ou algo assim, para ser mais claro. Como por exemplo o filme que Tim Burton fez em preto e branco, Ed Wood, que ele fez sabendo que o público não iria aceitar. Tenho amigos que não são cineastas mas que vão querer ver um filme de Jim Jarmusch, mas assim que o filme começa, se for em preto e branco, eles pensam: “Ah, é um filme antigo”. Filme em preto e branco para o frequentador de cinema é igual a filme antigo ou filme mudo. E este foi um dos motivos para não ter feito meu filme em preto e branco. Por outro lado, acho que estilisticamente adoraria tê-lo feito em preto e branco, mas não era a ideia por trás do projeto.

Gus Van Sant, cineasta, em entrevista ao crítico de cinema Pedro Butcher (23 de abril de 2011; a entrevista foi publicada no catálogo Hitchcock, da mostra organizada pelo CCBB no Brasil; pgs. 333, 334, 338 e 339). Van Sant refilmou Psicose plano a plano e o filme foi lançado em 1998, tornando-se rapidamente um fracasso. Acima, Anne Heche como Marion Crane.

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