A Origem, de Christopher Nolan

O invasor de sonhos leva na viagem seus próprios fantasmas. Seu principal obstáculo ao longo dessa ideia de Christopher Nolan é sua mulher morta.

O próximo passo, contudo, não é extrair um pedaço de sonho ou descobrir uma ideia. Com seus comparsas de roupa chique e gel no cabelo, a exemplo dele próprio, Cobb (Leonardo DiCaprio) precisa inserir uma ideia na mente do herdeiro de uma grande corporação de tecnologia. As ideias, em A Origem, são os itens mais valiosos.

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A do realizador vem embalada a movimento excessivo. Nolan não quer apenas um filme sobre viagens aos sonhos e o tempo todo aposta na ação: tiros, explosões, gente dormindo dentro de outros sonhos, inúmeras camadas que, a cada passagem, possibilita um novo desafio – enquanto todos tentam acordar ao mesmo tempo.

O visual, inegavelmente belo e instigante, chega apenas ao sonho comportado, a solavancos que retiram a gravidade, bandidos que surgem do nada e seguem a lugar algum (para serem abatidos, atrapalhar o movimento), além do trem que irrompe a cidade, susto para quem não contava com a grande peça, intruso a colidir com carros, à chuva.

Um sonho para ser tocado e, paradoxalmente, para colocar o espectador no campo do possível, para compreender que, nesses limites, ainda vale falar de planos e estratégias. É Hollywood tentando ousar sem nunca deixar de ser a mesma, no terreno em que muitas explicações precisam ser dadas para que, no fim, a charada seja posta.

A boa ideia de Nolan é inegável. O ponto de partida é interessante. Mas, a depender do diretor e sua forma veloz, resta a ideia. O bolo montado faz um filme de ação e espionagem parecer algo mais, à medida que o frenesi dá o tom. As personagens correm enquanto falam. Faltam vida e densidade dramática a esses seres robóticos.

Nos sonhos, as personagens de Nolan não percorrem um espaço derretido e de estruturas frágeis. Ao contrário, assistem a esse derretimento quando estão prestes a escapar ou a alguma distância segura. O comodismo visual – antes a beleza, depois o caos – mostra o quanto o cinema ainda desconfia da capacidade do público.

E para parecer difícil, A Origem trabalha com uma metralhadora giratória de situações, diferentes camadas, lembranças e sonhos, ou tudo misturado. Para Cobb, a nova missão significa o retorno para casa, para os filhos dos quais não lhe restam nem as faces. Em suas lembranças, o protagonista não consegue alcançá-las.

Após viver longo tempo em sonhos com a mulher (ali o tempo passa mais rápido e a cada camada isso aumenta), ele viu a amada suicidar-se. Segundo sua explicação, ela não soube lidar com as diferenças entre realidade e sonho, pensando ainda estar no segundo. Acreditava que a morte poderia tirá-la do onirismo no qual se viu fincada.

O herói culpa-se pela morte dela, interpretada por Marion Cotillard. Seu fantasma ou sua lembrança continua a persegui-lo. Em diferentes momentos, Nolan deixa o espectador com dúvidas sobre o próprio Cobb. Seria ele o verdadeiro sonhador? A razão não estaria com a mulher, agora convertida em obstáculo para sua memória?

O cineasta não pretende responder à charada representada pelo totem que não para de girar, forma encontrada por Cobb para confirmar a presença – ou não – da realidade. A dúvida acomoda um final feliz e a ideia que norteia o filme: o sonho pode ser bom ou perigoso, sobretudo quando soa real.

(Inception, Christopher Nolan, 2010)

Nota: ★★★☆☆

Veja também:
Nolan: “A ideia é colocar a plateia num estado de confusão mental”

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