Morto aos 103 anos, Kirk Douglas não será lembrado por um filme menor. Spartacus é uma grande obra. Stanley Kubrick, à época, não era um diretor das primeiras fileiras de Hollywood. Após ter trabalhado com o jovem cineasta em Glória Feita de Sangue – que é melhor que o seguinte –, Douglas decidiu levá-lo para Spartacus após demitir Anthony Mann.
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Não apenas ele. O ator e coprodutor do épico de 1960 bancou o nome de Dalton Trumbo no roteiro. Uma ousadia: Trumbo integrava a Lista Negra de Hollywood, a apontar os comunistas “infiltrados” na indústria do espetáculo. Por anos, Trumbo teve de assinar roteiros com pseudônimos. Seu retorno marcou o início do fim do período.
A ação de Douglas revela alguém tão combativo dentro das telas quanto fora. Algumas de suas melhores interpretações remontam à imagem: o homem intenso em cada ato, explosivo em diferentes personagens. Spartacus, de escravo a líder de uma revolução, é apenas um deles. Seus vilões também merecem lugar de destaque.
Em seu terceiro filme, o noir Fuga do Passado, ele interpreta o maldoso Whit e quase rouba a cena do protagonista Robert Mitchum. Os atores voltariam a se encontrar mais tarde em Desbravando Oeste. Mitchum como o guia pacato, Douglas como o ambicioso desbravador.
Apesar do sucesso Quem é o Infiel?, em outro papel menor, Douglas chegou de vez ao estrelato com O Invencível, de 1949, que lhe valeu a primeira indicação ao Oscar de melhor ator. A segunda veio em seu grande momento nas telas, o papel do produtor de cinema sem escrúpulos de Assim Estava Escrito, no qual atua ao lado de Lana Turner.
De queixo perfurado, sua marca registrada, o ator viveria o pintor van Gogh em Sede de Viver. Outra grande interpretação, outra indicação ao Oscar – perdendo para o Yul Brynner de O Rei e Eu, musical com todos os traços do cinema clássico da época.
Pouco antes, a face cínica de Douglas serviu ao diretor mais ácido da Hollywood clássica: Billy Wilder. Produto das pitadas de sexo da screwball, a zombar de regimes totalitários, Wilder, com Douglas, voltou suas armas à imprensa americana da época em A Montanha dos Sete Abutres.
Em um local perdido no mapa, o jornalista marrom Chuck Tatum vê a oportunidade de dar uma virada em sua carreira. Aproveita-se de uma vítima presa em uma mina, manipula autoridades e a opinião pública para fabricar, dias a fio, novas manchetes.
A energia de Douglas produzia grandes personagens como Tatum. Magnífica, de estranha atração apesar de corrupta. A mesma levaria ao oposto, ao destemido coronel Dax de Glória Feita de Sangue. Difícil não se emocionar com sua convicção ao defender três soldados condenados à morte. Bom ou mau, há sempre o grande ator.
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