Em seu filme O Pianista, de 2002, o senhor acertou contas com suas memórias. É uma das últimas testemunhas contemporâneas que podem falar sobre as experiências no gueto de Cracóvia. O senhor fala sobre isso? Com seus filhos, por exemplo?
É complicado. Tento me lembrar da minha relação com meu pai. Depois que ele voltou do campo de concentração de Mauthausen, às vezes se reunia com outros sobreviventes. E eles falavam do horror e de como sobreviveram. Como meu pai costumava usar o papel de sacos de cimento para cobrir as feridas infeccionadas, como prendiam o papel com arame para que as pulgas não entrassem. Eu não gostava dessas histórias. O que eu menos gostava era quando falavam sobre as punições.
O senhor estava consciente do que estava acontecendo quando os alemães invadiram a Polônia?
Eu tinha seis anos, mas estava consciente. Os adultos falavam horas sobre isso. Do seu medo, do ódio, da resistência patriótica polonesa contra os alemães. A primeira vez que vi um alemão foram soldados marchando sobre Varsóvia. Lembra-se da sequência de O Pianista? Foi exatamente como eu a vivi. Nós os observávamos, e muitos viraram as costas para eles. O meu pai estava ao meu lado e disse em polonês: “Esses putos. Esses putos”.
O senhor viu seu pai e outras pessoas sendo reunidas para serem levadas ao campo de concentração.
Corri até ele. Mas ele me afastou, dizendo: “Vá embora! Vá embora!”. Eu sei que ele estava tentando salvar minha vida. Instintivamente, queria ficar ao lado do meu pai. Eu teria usado qualquer desculpa para ficar com ele. A criança é por natureza otimista e acredita que tudo ficará bem. No entanto, eu sabia o que estava em jogo. Naquela época, a morte estava à espreita, então fugi. Foi assim que meu pai salvou minha vida.
Roman Polanski, cineasta, em entrevista ao jornal El País (“Roman Polanski: ‘Torturei atores. Não intencionalmente, é claro'”; 8 de dezembro de 2013; leia aqui). Acima, Polanski nos bastidores de O Pianista, que lhe rendeu a Palma de Ouro e o Oscar de melhor diretor.
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