Eu odeio os mecanismos artificiais da narração cinematográfica convencional. A vida tem um ritmo completamente diferente, às vezes rápido, às vezes extremamente lento. Em uma história sobre sentimentos, como A Aventura, senti a necessidade de ligar sentimentos ao tempo. Seu próprio tempo. Quanto mais vezes vejo A Aventura, mais estou convencido de que encontrei o ritmo certo, não acho que poderia ter tido outro ritmo além do que tem.
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Enquanto eu estava filmando, passei por cinco meses extraordinários. Extraordinários porque eram violentos, exaustivos, obsessivos, muitas vezes dramáticos, angustiantes, mas acima de tudo satisfatórios. E eu acho que no filme você percebe isso. O mais difícil para mim foi me desligar de todas as coisas que poderiam dar errado – e muitas coisas deram errado. Nós filmamos sem um produtor, sem dinheiro e sem comida, muitas vezes arriscando nossos pescoços no mar, nas tempestades. Tudo isso mudou as relações entre nós, sejam pessoais ou profissionais. Nós assistimos a incríveis e belos fenômenos naturais. A minha maior dificuldade, digo de novo, era me isolar de tudo o que estava acontecendo, de modo que apenas o essencial fosse filtrado para o filme – de modo que tivesse sua própria atmosfera, separado do que estávamos passando na vida real. Eu costumava levantar todos os dias às três da manhã só para ficar sozinho, em paz e conseguir refletir sobre o que estávamos fazendo.
Michelangelo Antonioni, diretor de A Aventura, em entrevista a François Maurin em setembro de 1960 (reproduzida no site Cinephilia & Beyond; leia aqui na íntegra e em inglês; a tradução é deste site).
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