Bom Comportamento, de Benny e Josh Safdie

A opção da personagem de Robert Pattinson pelo cabelo louro deixa claro do que trata Bom Comportamento, de Benny e Josh Safdie: a artificialidade. Sem esquecer o aspecto barato, o que casa à perfeição ao tipo do pequeno bandido, alguém que erra mais do que acerta, preso às poucas horas entre o dia sem sol e a noite banhada por luzes artificiais.

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Os irmãos Safdie não perdem tempo: a segurança na direção é tão grande que renunciam às explicações verbais. Apostam no movimento, no tropeço, ou mesmo no suor. Ou ainda no sofrimento, na situação em que o pequeno criminoso deixa ver, e que ainda resta à contramão de tantos sinais paralelos: a bondade entre irmãos.

A fraternidade sobrevive. O irmão corre contra o tempo, de local em local, em uma única noite, para tentar libertar o outro, preso após roubar um banco. Nessa tentativa de conseguir dinheiro, o primeiro chega a um parque de diversão, na madrugada, para retirar dali não mais que um frasco com ácido. Uma aventura que só não chega ao absurdo porque em momento algum se vê algo cômico. Suas personagens mantêm seriedade.

O protagonista é Connie (Pattinson). Rapaz esperto que guia o irmão, Nick (Benny Safdie), para o assalto a banco, crime silencioso no qual apenas trocam um recado, em papel, com a caixa. É simples: dizem que querem todo o dinheiro, que estão armados, o que logo surte efeito: a mulher devolve a mala de ambos com a bolada em seu interior.

O que parece fácil lança a dupla ao oposto: eles são obrigados a esconder o dinheiro, depois a fugir da polícia quando Nick não sabe lidar com momentos de tensão. Ele corre, o que obriga Connie a correr também; depois é preso ao bater em uma porta de vidro, o que faz com que o outro procure por mais dinheiro para libertá-lo – além da quantia roubada.

O filme lança o público aos espaços sórdidos em que tudo parece estar à venda, em que tudo é fácil, tocado ao menor gesto de avanço: o filme define-se como uma jornada delirante, porém realista, no interior da noite que só termina com uma briga pelo mesmo frasco de ácido perdido no citado parque de diversão. É quando se percebe que retirar o irmão da cadeia não é o mais importante ao roteiro. O filme prefere o imprevisível.

A jornada perde o rumo, o filme curiosamente cresce. A narrativa crava-se nas horas, nos instantes, nas pequenas besteiras e quedas. Surgem novas personagens. O problema de Connie é maior do que se imaginava. Na pele dessa figura difícil de definir, Pattinson tem talvez a melhor interpretação de sua carreira, alguém que, à exceção do irmão, seu último elo com a emoção verdadeira, não se liga a nada e a ninguém.

O que assusta nesse trabalho dos Safdie é justamente a indiferença das personagens, forma quase sempre desleal de se buscar alguma vantagem – à medida que as luzes neon conferem um aspecto irreal, futurista, somado às vidas aos cantos, de pessoas que não se tocam, separadas pelas paredes dos pequenos comércios que vendem comida rápida.

Não se torce por Connie nem por ninguém. O que está em jogo é o tempo, a espera, o absurdo que leva o público a uma nova manobra, a se perder – de novo. Perder-se é a regra dos Safdie nessa obra de intensidade, de garotos que se julgam grandes bandidos, de policiais distantes, de doentes em camas de hospital, sozinhos, à luz da televisão ligada.

A primeira imagem do filme, de tão deslocada, é quase uma publicidade de Nova York: um grande prédio visto de fora e do alto. O corte leva à face, ao elo fraco da jornada, o irmão com aparente deficiência mental, Nick. O psicólogo faz perguntas simples. Ele tem dificuldade para respondê-las. O prédio de estrutura aparentemente inabalável dá vez à face humana, ao rapaz que não resiste aos golpes desse espaço. Fica-se com a realidade.

(Good Time, Benny Safdie, Josh Safdie, 2017)

Nota: ★★★★☆

Veja também:
The Square, de Ruben Östlund

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