Pode haver algo mais falso e exagerado que um filme sobre o mundo da moda, com tendência ao terror, realizado por um diretor como Nicolas Winding Refn? Não se trata de dizer que o mundo da moda não é indigesto, nem negar a beleza do filme.
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É importante lembrar – e isso é evidente em Demônio de Neon – que apenas a beleza das imagens não garante a grandeza de um filme. Pois Refn apoia-se na beleza individual, na extensão do plano, vitimado pelo vazio.
Sua fé cega nessa beleza – ou falsa beleza – é tamanha que termina refém de um inócuo exercício de estilo, em obra sem articulação convincente entre situações. O terror é feito às tijoladas, abrupto, a ser deglutido quase à força pelo espectador que acompanha a enxurrada de beldades inexpressivas que correm pela tela.
A ideia, desde o primeiro plano, é casar moda à morte. Lá está a bela e jovem Elle Fanning deitada em um sofá, em um estúdio, fotografada com sangue no pescoço. A imagem antecipa o que vem a seguir: belezas mortas em um meio sufocante.
Fanning vive Jesse, aspirante à modelo que cai nas graças de um fotógrafo famoso, de um estilista famoso e do jovem que se apaixona por ela, o único para ser chamado de “comum” nesse desfile de figuras ultrajantes que tentam impressionar pelo inesperado.
Ter modelos canibais e assassinas, acredita Refn, é a forma para se atingir o terror. Falta naturalidade no desenvolvimento da trama, como qualquer passo para se compreender o caminho de suas personagens. Inveja e desejo assassino são lançados ao léu.
A protagonista é uma das várias garotas despejadas em Los Angeles – sem família, sem raízes, “sem talento para qualquer coisa”, como confessa – e que buscam oportunidades por razões óbvias: são belas e nada mais.
É o caso de questionar: teria Refn produzido todo esse vazio de maneira deliberada, para parecer inócuo, chegando às raias do insuportável? Ainda assim, falta um mínimo de articulação – necessário mesmo a exercícios com tons surrealistas, como prova o grande David Lynch e seu Cidade dos Sonhos.
O mundo da moda pode ser insuportável. Sem novidades. Bertrand Bonello conseguiu resultados muito superiores com Saint Laurent. O exemplo do francês talvez ajude a iluminar o fracasso do dinamarquês: ainda que presas em redoma particular, universo próprio, as personagens do primeiro são palpáveis e emocionam.
Sobram imagens meramente belas ou repulsivas em Demônio de Neon. Refn vive do contraste. Sexo com cadáveres, banquetes canibais e banhos de sangue são insuficientes quando o material não lhes garante sentido maior. Para alguém inclinado a essas opções, melhor investir em publicidade ou desfiles de moda.
(The Neon Demon, Nicolas Winding Refn, 2016)
Nota: ★☆☆☆☆
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