O vilão de A Lenda de Tarzan utiliza um terço para enforcar e prender seus oponentes. Ainda nos primeiros instantes do filme de David Yates, ele apanha uma flor enquanto carrega o mesmo objeto, pela mata, com o crucifixo à mostra.
O momento rápido resume o que vem pela frente: o conflito entre natureza e civilização, a entrada do homem branco no espaço dos animais e, por ceifar a flor, o desejo de saque. Aqui, a natureza voltar-se-á contra esses homens perigosos de terno branco, sorriso cínico, encarnado, no caso, por Christoph Waltz.
Curta o Palavras de Cinema no Facebook
Previsível, a vingança da natureza carrega o romantismo visto antes em Avatar, de James Cameron. Mas foi Cameron, vale lembrar, quem tomou esses contornos emprestados de fábulas como Tarzan e Mogli. Yates apenas os toma de volta.
O menino criado entre gorilas, Tarzan (Alexander Skarsgård), está na cidade, Londres, no início dessa nova versão. Vê-se integrado entre os supostos seres educados de chapéu e carruagens. Para conferir as realizações do rei belga no Congo, ele é então convidado a retornar à África. Os homens brancos, Waltz à frente, desejam capturá-lo.
A nova história é entrecortada pela passada, pelas lembranças: são os momentos em que o bebê John Clayton torna-se Tarzan ao receber os cuidados de uma Gorila, também sua luta pela sobrevivência, seu encontro com a jovem Jane (Margot Robbie).
A opção narrativa parece atraente. Serve para tentar legitimar, antes, o homem John Clayton, não o herói Tarzan. Dessa forma, o espectador não é levado a conhecer a outra transformação: como Tarzan torna-se o aristocrata louro que vive em Londres.
Portanto, soa falso: é como se o homem branco nunca tivesse deixado o animal, ou como se esse herói, Tarzan, no fundo não funcionasse – creem seus criadores, frente ao público chegado a heróis planos – como um selvagem afeito às leis da selva.
Nesse herói vê-se apenas o homem, ou quase sempre este. Ainda que a produção comandada por Yates tenha todos os contornos do cinema de heróis da atualidade, tenta, a certa altura, ser levada a sério – e recusa a aventura básica de seu parente próximo e recente, Mogli: O Menino Lobo, de Jon Favreau, superior em quase tudo.
O contraponto ao distante e Skarsgård é a personagem de Samuel L. Jackson, americano caçador e falante, dono das piadas que ora ou outra ganham espaço. A humanização da história é conferida a esse afro-americano que lutou na Guerra Civil e foi ao Congo experimentar o estranhamento. Ou seja, o negro que não reconhece suas raízes.
A ação vem na sequência: a luta de Tarzan com um gorila, o rapto de Jane e o levante dos animais contra os brancos chegados ao chá da tarde, à espera de pedras preciosas e seus caçadores de recompensa. Serão atropelados pela mãe natureza.
(The Legend of Tarzan, David Yates, 2016)
Nota: ★☆☆☆☆
Veja também:
Os dez piores filmes de 2015