Enquanto procura pela mulher desaparecida, o médico interpretado por Harrison Ford descobre locais sórdidos, frequentados por bandidos e traficantes. Quase tudo dá errado em sua passagem por esses locais. A jornada mais parece pesadelo.
Talvez seja: ainda no início de Busca Frenética, ele dorme quando a mulher já havia desaparecido. Ao acordar, decide procurá-la. Passa pelo saguão do hotel, questiona funcionários e comerciantes próximos. Aos poucos, levanta pistas e descobre que a companheira teria sido sequestrada por criminosos.
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A trama de Busca Frenética parte do impensável. Seu protagonista, o médico Richard Walker (Ford), está acima de qualquer suspeita. Se o espectador exclui a possibilidade do pesadelo, então sobra o acaso. E o filme continua excitante.
Na pele de Walker, Ford desdobra-se bem como alguém que sabe pouco ou quase nada. Médico experiente, correto, pai de família, o tipo que chora ao falar com os filhos no telefone – sozinho com seus segredos – e sem jeito ao papel do herói.
Nesse mundo às sombras, feito de acidentes, ele sofre ao procurar pela mulher, ao perceber, mais tarde, que não pode contar com a polícia, ou com os funcionários do consulado americano em Paris, cidade à qual viajou para participar de uma convenção.
O diretor Roman Polanski retoma o clima das fitas de espionagem de Hitchcock, sobretudo em sua fase inglesa. Filmes em que homens comuns são tragados para mundos distantes, com seres inconfiáveis e mulheres belas, talvez fatais.
Faz pensar também em obras como O Terceiro Homem, mais políticas do que parecem, com casos estranhos, pessoas cínicas aos cantos, segredos vitais, armas poderosas – no clima do mundo ainda polarizado da época, durante a Guerra Fria.
Polanski dilui estranhezas entre a trama. Como em outros de seus filmes, algo beira o bizarro. No momento em que Walker quase deixa todo o conteúdo da mala cair do telhado – o que inclui o artigo procurado pelos vilões –, o espectador percebe que o filme aproxima-se até da comédia absurda, um pouco ao modo de Hitchcock.
Mais tarde, quando dança com a nova companheira, a garota que trouxe a mesma mala para Paris, ele parece estar bêbado, ou delirando, o que nunca é possível saber.
Se no nível superficial o filme funciona dentro do proposto, em nível profundo se revela mais interessante: o caminhar de um homem por outro universo, sozinho até certa altura, fora da vida confortável e em uma Paris pouco iluminada.
O herói acidental tem a companhia da bela Michelle (Emmanuelle Seigner), de roupas de couro, em vida noturna. É a materialização do risco, menina falante e intrometida, ponte perfeita para que algo dê errado ao fim. Com Walker, ela sente-se cuidada, tem atenção, e sabe a quem pode retornar sem o risco de perder a cabeça.
Entre ambos, sempre resta algo a mais. Inevitável. Walker resiste aos flertes dela, tenta manter a imagem de sempre, mas sabe da dificuldade: a certa altura, ele precisa mentir à polícia e fugir dos homens do consulado para recuperar a mulher.
Ao fim, Michelle vai embora. A mulher de Walker retorna. Com ela, os antigos contornos, a volta aos Estados Unidos. Alguém precisa ser sacrificado em nome da vida pacata do homem comum, não mais do que prevê a personagem.
(Frantic, Roman Polanski, 1988)
Nota: ★★★★☆
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