Quando soube que David Lean faria um filme de Doutor Jivago, comprei o livro e comecei a lê-lo, para ver se havia um papel para mim. Nunca imaginei que me pediriam para fazer o papel central, porque pensava que as pessoas me conheciam como um árabe em um camelo e que não poderiam pensar em mim como um poeta russo.
O que era difícil imaginar aconteceu: o papel de Yuri Jivago terminou no colo de Omar Sharif, lembrado até então como o Ali de Lawrence da Arábia – também do mestre David Lean. Ninguém esquece sua aparição neste épico, com o camelo no “fim” da paisagem do deserto, lentamente à frente, aos olhos do herói de Peter O’Toole.
Ambos – um egípcio e um inglês – eram pouco conhecidos. Na tela, a química perfeita, entre a rudeza e a aparente sensibilidade do escritor, o que Sharif deveria levar a sua personagem seguinte, Yuri. O terreno, então, era o da Revolução Russa. Mais de uma vez é possível ver seu rosto de desespero, às vezes sem saber o que fazer. Homem forte, ao mesmo tempo deslocado, humano demais a tantas convulsões.
Ao analisar Lawrence da Arábia, a crítica Pauline Kael observou em Ali um “xeque bonitão, de líquidos olhos castanhos e falas convencionalmente simples de dizer”. A presença forte do ator quase dispensa essas palavras, como se tudo soubesse sobre o deserto e suas guerras.