Os homens são um pouco infantis e incapazes de prender as feras que criaram. Um deles – com pinta de rock star e interpretado por Jeff Goldblum – diz que a natureza deve seguir seu curso. Reviver monstros do passado pode ser má ideia.
Esse homem faz parte do grupo de pessoas levado ao Parque dos Dinossauros ainda não inaugurado do filme de Steven Spielberg. Ganha vida ali um sonho antigo: recriar os dinossauros com engenharia genética, unir passado e futuro.
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Essa junção de tempos logo dá vez ao confronto: os homens, claro, fracassam na tentativa de dominar suas feras. Os gigantes de garras à mostra logo derrubam as estruturas feitas de cimento, metal e cercas elétricas.
De 1993, Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros tem momentos vivos na mente de qualquer cinéfilo – entre outros de Spielberg, como o do policial que diz necessitar de um barco maior, em Tubarão, ou mesmo o do garoto e do alienígena em frente à Lua, em E.T. – O Extraterrestre.
Mais de uma vez, homens olham à água que treme pouco antes da aparição do tiranossauro. São pequenos instantes nos quais Spielberg mostra a que veio: trata-se de uma deliciosa e amedrontadora celebração de detalhes.
Em suma, um filme – ou mais um – sobre o fracasso dos homens, impossibilitados de domar suas criações. Vale lembrar os diferentes tipos em cena, como o que anuncia o apocalipse (Goldblum), o obsessivo e sonhador dono do parque (Richard Attenborough) e o especialista com traços de aventureiro (Sam Neill).
Perto da concretização do sonho, todos viram crianças: ao verem os primeiros dinossauros, elevam-se sobre o carro, desejam tocá-los, emocionam-se como se tudo fosse o que parece. Nessa perfeita harmonia, o grande animal busca o alimento.
Primeiro, o paraíso com sol; depois, o inferno e sua tempestade – somados ao grito das crianças, ao som e à respiração dos dinossauros. Os próprios homens – nesse caso, Alan Grant (Neill) – não sabem lidar com as crianças, suas criações.
De tal ponto nascem os monstros: quando saem do ovo, parecem belos e inocentes; depois começam a perseguir os outros, a dominar o espaço de seus criadores – como Frankenstein ou King Kong, vítimas de homens obsessivos. Passam por trás do desenho que deveria reproduzi-los, na parede, e se revelam piores: são reais.
Grant, o protagonista, precisa aprender a lidar com as crianças para escapar da selva e retornar à segurança. Faz parte de sua sobrevivência. E será uma criança, por sinal, que conseguirá lidar com o sistema informatizado e devolver a energia elétrica ao parque – depois de horas na escuridão, contorno do velho mundo selvagem.
A certa altura, as crianças são encurraladas pelos temidos velociraptors na cozinha do parque. Spielberg aproveita para lançar um interessante jogo de espelhos em que os monstros refletem os inocentes, no qual esses mesmos monstros são vítimas do desejo de devorar a última esperança entre os adultos.
O mal, como se vê, sempre recai sobre os homens, não sobre a fera. Com suas palavras sábias, com seu ar de certeza e sua teoria do caos, Ian Malcolm (Goldblum) assume o posto do profeta. Conclama a força da natureza, a vitória dos dinossauros.
O cinema necessita desse ar religioso, como se o mal e a revolta das criações, ou da natureza, não pudessem ser obra do acaso. O cinema de Spielberg não abarca acasos. Entretenimento e algo mais, com boa aventura e sinais de Henry Frankenstein.
(Jurassic Park, Steven Spielberg, 1993)
Nota: ★★★★☆
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